Descaminho x Princípio da insignificância – Crime Tributário

Descaminho x Princípio da insignificância – Crime Tributário

Descaminho x Princípio da insignificância - Crime Tributário

DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. A introdução de produtos com pequena ilusão de tributos não justifica a resposta penal, submetendo-se a sanções de natureza administrativo-tributária” (TRF-4 – RCCR: 50010578920154047114 RS 5001057-89.2015.404.7114, Relator: LEANDRO PAULSEN, Data de Julgamento: 09/12/2015, OITAVA TURMA, Data de Publicação: D.E. 18/12/2015).

VOTO

O Senhor Desembargador Leandro Paulsen:

1 . Caso concreto. Narra a denúncia que em 09 de abril de 2014, na BR 386, em Lajeado/RS, o denunciado CRISTIANO PEREIRA MULLER, foi flagrado na posse de mercadorias estrangeiras desacompanhadas da documentação comprobatória de sua regular importação, localizadas no ônibus da empresa Italen Viagens e Turismo Ltda. – ME, placas LYZ 4503.

As mercadorias foram avaliadas em R$ 299,00 (duzentos e noventa e nove reais), sendo que a ilusão de tributos decorrentes da conduta totaliza R$ 180,19 (cento e oitenta reais e dezenove centavos), conforme Relação de Mercadorias anexa ao Auto de Infração e TAGF nº 10521.720376/2014-12.

2 . Princípio da insignificância. A insignificância constitui critério para afastar a persecução penal, por ausência de justa causa, relativamente a condutas que, embora correspondentes à descrição literal do tipo penal, sejam de tal modo irrelevantes em função da sua diminuta ofensividade, que sequer afetem o bem protegido pela norma, não atraindo reprovabilidade que exija e justifique, minimamente, a resposta em nível penal. Isso porque a criminalização de uma conduta, com a possibilidade inclusive de privação da liberdade do infrator, só se legitima se constituir meio necessário para a proteção do valor que lhe é subjacente.

Destaco que a 4ª Seção, no julgamento dos Embargos Infringentes e de Nulidade nº 5005227-48.2012.404.7005/PR, em 04/09/2014, firmou entendimento no sentido de afastar a relevância da habitualidade para fins de aplicação do princípio da insignificância. Assim, a reiteração de condutas atípicas não as torna crime, devendo-se atentar para cada fato e não para seu autor. Não obstante guarde ressalva a tal entendimento, a decisão do Colegiado deve ser prestigiada. Ademais, tais fatos seguem sujeitos às respectivas penalidades administrativas.

3 . Princípio da insignificância no crime de descaminho. Tratando-se de descaminho, tem-se adotado como referência monetária para a verificação da significância da conduta, o patamar utilizado pelo Fisco como piso para a cobrança judicial de créditos tributários. Atualmente, as duas Turmas do Supremo Tribunal Federal vem sedimentando o entendimento de que este patamar de insignificância é encontrado no art. 20 da Lei nº 10.522/2002, com a atualização das Portarias 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda, notadamente a importância de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

O Supremo Tribunal Federal entende que, além do valor material reduzido do objeto do crime, devem estar presentes, de forma concomitante, os seguintes requisitos: a) conduta minimamente ofensiva; b) ausência de periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d) lesão jurídica inexpressiva (STF, HC 115319, jun/2013).

Veja-se:

“HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. DESCAMINHO. VALOR INFERIOR AO ESTIPULADO PELO ART. 20 DA LEI 10.522/2002. PORTARIAS 75 E 130/2012 DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. REGISTROS CRIMINAIS PRETÉRITOS. ORDEM DENEGADA. 1. A pertinência do princípio da insignificância deve ser avaliada considerando-se todos os aspectos relevantes da conduta imputada. 2. Para crimes de descaminho, considera-se, para a avaliação da insignificância, o patamar previsto no art. 20 da Lei n.º 10.522/2002, com a atualização das Portarias 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda. Precedentes. 3. Embora, na espécie, o descaminho tenha envolvido elisão de tributos federais em quantia inferior a R$ 20.000,00, a existência de registros criminais pretéritos obsta, por si só, a aplicação do princípio da insignificância, consoante jurisprudência consolidada da Primeira Turma desta Suprema Corte (HC 109.739/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 14.02.2012; HC 110.951/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 27.02.2012; HC 108.696/MS, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 20.10.2011; e HC 107.674/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 14.9.2011). Ressalva de entendimento pessoal da Ministra Relatora. 4. Ordem denegada. (HC 120438, Relator (a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 11/02/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-048 DIVULG 11-03-2014 PUBLIC 12-03-2014).

“PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE CONTRABANDO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REITERAÇÃO DELITIVA. ORDEM DENEGADA. I – Nos termos da jurisprudência deste Tribunal, o princípio da insignificância deve ser aplicado ao delito de descaminho quando o valor sonegado for inferior ao estabelecido no art. 20 da Lei 10.522/2002, com as atualizações feitas pelas Portarias 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda. II – No caso sob exame, o paciente detinha a posse, sem a documentação legal necessária, de 22.500 (vinte e dois mil e quinhentos) maços de cigarro de origem estrangeira, que, como se sabe, é típica mercadoria trazida do exterior, sistematicamente, em pequenas quantidades, para abastecer um intenso comércio clandestino, extremamente nocivo para o País, seja do ponto de vista tributário, seja do ponto de vista da saúde pública. III – Os autos dão conta da reiteração delitiva, o que impede a aplicação do princípio da insignificância em favor do paciente em razão do alto grau de reprovabilidade do seu comportamento. IV – Ordem denegada” (HC 118000, Relator (a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 03/09/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-182 DIVULG 16-09-2013 PUBLIC 17-09-2013)

Perceba-se que o sujeito flagrado praticando o crime de descaminho com ilusão tributária inferior ao patamar de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), submete-se exclusivamente às sanções de natureza administrativa. Para tais casos, a resposta penal afigura-se demasiada.

4. Conclusão.

Estando o valor dos tributos iludidos aquém do patamar de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) estabelecido pela Portaria MF nº 75/2012, não se caracteriza o descaminho (art. 334 do Código Penal), por ausência de potencial ofensivo da conduta que justifique a resposta penal.

Dispositivo.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso em sentido estrito.

Leandro Paulsen
Relator