O Direito de Imagem em Portugal: Proteção Legal e Limitações

O Direito de Imagem em Portugal: Proteção Legal e Limitações

Introdução

O direito à imagem é um dos direitos fundamentais da personalidade, reconhecido e protegido pela legislação portuguesa. Esse direito está diretamente ligado à dignidade humana e ao respeito pela privacidade, sendo resguardado tanto pela Constituição da República Portuguesa quanto pelo Código Civil e pelo Código Penal. O objetivo deste artigo é apresentar os principais aspectos legais do direito de imagem, tornando-o acessível ao público em geral.

Constituição da República Portuguesa

A Constituição Portuguesa, no artigo 26.º, n.º 1, consagra a proteção da imagem como parte dos direitos fundamentais de cada cidadão. Este artigo garante a todos os indivíduos o direito à identidade pessoal, ao bom nome e à reputação, assim como à imagem, que não pode ser explorada sem o seu consentimento. Eis o que diz a Constituição:

“Artigo 26.º (Outros direitos pessoais)

  1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação.”*

Em resumo, o direito à imagem é uma garantia constitucional, assegurando que ninguém poderá expor ou utilizar a imagem de outra pessoa sem a devida autorização.

Código Civil: Artigo 79.º

Além da Constituição, o Código Civil Português, no seu artigo 79.º, regula de forma mais específica o uso da imagem. Este artigo define que o retrato de uma pessoa não pode ser utilizado, exposto ou comercializado sem o seu consentimento expresso. Aqui está o que a lei diz:

Artigo 79.º (Direito à imagem)

  1. O retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela; depois da morte da pessoa retratada, a autorização compete às pessoas designadas no n.º 2 do artigo 71.º, segundo a ordem nele indicada.
  2. Não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou de justiça, finalidades científicas, didácticas ou culturais, ou quando a reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido publicamente.
  3. O retrato não pode, porém, ser reproduzido, exposto ou lançado no comércio, se do facto resultar prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro da pessoa retratada.

Este artigo é claro ao afirmar que o consentimento é a regra geral, exceto em situações específicas, como em casos de figuras públicas ou eventos de interesse geral, desde que a utilização da imagem não prejudique a honra ou a dignidade da pessoa retratada.

Código Penal: Gravações e Fotografias Ilícitas

Além do Código Civil, o Código Penal Português, no artigo 199.º, aborda a questão das gravações e fotografias ilícitas. Esse artigo criminaliza a captação ou utilização de imagens de uma pessoa sem o seu consentimento, especialmente quando há violação da privacidade ou da vontade expressa da pessoa retratada. A norma prevê penas para quem tirar ou divulgar fotografias ou vídeos sem autorização, mesmo que estas imagens tenham sido inicialmente obtidas de maneira legal.

Artigo 199.º (Gravações e fotografias ilícitas)

  1. Quem sem consentimento:
    a) Gravar palavras proferidas por outra pessoa e não destinadas ao público, mesmo que lhe sejam dirigidas; ou
    b) Utilizar ou permitir que se utilizem as gravações referidas na alínea anterior, mesmo que licitamente produzidas;
    é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 240 dias.
  2. Na mesma pena incorre quem, contra vontade:
    a) Fotografar ou filmar outra pessoa, mesmo em eventos em que tenha legitimamente participado; ou
    b) Utilizar ou permitir que se utilizem fotografias ou filmes referidos na alínea anterior, mesmo que licitamente obtidos.
  3. É correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 197.º e 198.º.

Este artigo destaca duas condutas ilícitas: a captação de imagens sem consentimento e a utilização de imagens contra a vontade da pessoa retratada. Assim, ainda que a imagem tenha sido obtida com autorização, o seu uso posterior, sem o consentimento da pessoa, pode ser considerado crime.

Jurisprudência

Os tribunais portugueses têm reforçado a proteção ao direito à imagem, considerando-o um bem jurídico autónomo, separado de outros direitos, como a privacidade. Em uma decisão de 2015, o Tribunal da Relação do Porto afirmou:

“O direito à imagem constitui um bem jurídico-penal autónomo tutelado em si e independentemente do ponto de vista da privacidade ou intimidade retratada. O visado pode autorizar que lhe seja tirada uma fotografia e, ao mesmo tempo, não consentir que essa imagem seja divulgada ou utilizada.”
(Rec. n.º 101/13.5TAMCN-P1 / TRP / 05 Junho 2015)

Essa decisão confirma que o direito à imagem inclui tanto o direito de não ser fotografado quanto o direito de impedir a divulgação da imagem, mesmo quando a fotografia foi obtida com o consentimento inicial.

Conclusão

O direito à imagem em Portugal é amplamente protegido, garantindo que qualquer pessoa tenha controle sobre como sua imagem é utilizada. A legislação portuguesa é clara ao exigir consentimento prévio para a utilização da imagem, com poucas exceções, como em casos de figuras públicas ou situações de interesse público. Além disso, o uso indevido da imagem, sem autorização, pode gerar responsabilidade civil e até penal, refletindo a importância desse direito fundamental para a proteção da dignidade humana.

Adriano Martins Pinheiro, advogado em Portugal