Análise do Regulamento Geral do Ruído (Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro) e vizinhança.
Do que se trata a lei
O Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de janeiro, conhecido como Regulamento Geral do Ruído (RGR), estabelece normas destinadas à prevenção e controlo da poluição sonora em Portugal. O seu objetivo é proteger a saúde humana e o bem-estar das populações, bem como assegurar a qualidade ambiental, através da regulação dos níveis de ruído admissíveis em diferentes espaços e situações.
Os limites do ruído em uma área residencial
O regulamento define limites claros para o ruído ambiente em função do período do dia e da classificação da zona. Em áreas residenciais, os níveis máximos admissíveis de ruído são os seguintes:
Período diurno (das 07h00 às 22h00): 55 dB(A);
Período noturno (das 22h00 às 07h00): 45 dB(A).
Esses limites visam garantir a tranquilidade dos moradores e prevenir problemas de saúde, como stress e distúrbios do sono.
Ruídos gerados por vizinhos de apartamentos
Uma das situações mais comuns de conflito em áreas residenciais envolve ruídos provenientes de vizinhos em edifícios multifamiliares. Atividades como crianças brincando, conversas ou mesmo passos podem ser percebidas de forma diferente por vizinhos, dependendo do grau de isolamento acústico do edifício e da sensibilidade individual.
No entanto, o Regulamento Geral do Ruído não proíbe ruídos inerentes à vida quotidiana, como os provocados por crianças ou convivência familiar. Tais ruídos são considerados normais, desde que não ultrapassem os limites legais estabelecidos. Conflitos frequentemente surgem quando vizinhos demonstram comportamentos anti-sociais, intolerância ou sensibilidade exacerbada. Sobre este assunto a Agência Portuguesa do Ambiente diz em seu seu website que “o ruído de vizinhança é uma fonte de ruído não sujeita a requisitos acústicos estabelecidos legalmente”.
O método de medição do ruído e a produção de prova
A medição do ruído é um elemento essencial para determinar se os níveis estabelecidos pelo Regulamento Geral do Ruído estão a ser cumpridos. O procedimento deve ser realizado por entidades competentes e baseia-se em normas técnicas, como as previstas pela norma NP ISO 1996-1. Os principais aspetos do método incluem:
Equipamento de medição: Utilização de sonómetros devidamente calibrados;
Local de medição: A medição deve ser feita no ponto de receção afetado, como habitações ou locais sensíveis;
Período de medição: Realização em períodos representativos (diurno ou noturno), respeitando o contexto do ruído denunciado.
Os relatórios técnicos emitidos pelas medições constituem prova essencial em processos administrativos ou judiciais. Em casos de conflitos entre vizinhos, a medição adequada pode determinar se os ruídos excedem os limites legais ou se se tratam de situações normais de convivência.
Queixas indevidas e o código penal
Há casos em que vizinhos fazem queixas reiteradas sobre ruídos comuns à vida familiar, utilizando estas reclamações como forma de importunar ou criar tensão no ambiente residencial. De acordo com o Código Penal Português, em situações de abuso de direito ou uso inadequado de mecanismos legais, pode ser caracterizado o crime de denúncia caluniosa (artigo 365.º). Esse crime ocorre quando alguém, com intenção dolosa, acusa outra pessoa de um ato inexistente, causando-lhe prejuízo injustificado.
Além disso, o artigo 181.º do Código Penal tipifica a injúria, que pode ser aplicada em casos onde vizinhos utilizam queixas ou comportamentos para ofender a dignidade ou o bom nome de outro morador.
Conclusão
O Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de janeiro, oferece um quadro regulatório essencial para garantir a convivência harmoniosa em áreas residenciais, equilibrando direitos e deveres de todos os cidadãos. Embora a lei estabeleça limites claros para o ruído, é igualmente importante considerar a razoabilidade e o bom senso nas relações de vizinhança. Ruídos decorrentes da vida quotidiana não devem ser confundidos com perturbações reais, cabendo às partes envolvidas buscar soluções amigáveis sempre que possível. Em casos de conflito, o recurso à mediação ou à intervenção legal deve ser utilizado de forma equilibrada e responsável, evitando-se abusos ou injustiças.
Adriano Martins Pinheiro, advogado em Portugal