Vamos tratar de divórcio de brasileiros, casados no Brasil e residentes no exterior.
Para facilitar, temos o seguinte exemplo:
Maria e João são brasileiros e casaram no Brasil. Posteriormente, o casal mudou para Portugal. Estando em Portugal (residentes), o casal decidiu romper o matrimônio.
Para que o exemplo fique mais simples, vamos considerar que eles não tem filhos em comum, não tem bens a partilhar e não haverá pagamento de pensão alimentícia.
O advogado de Maria e João distribuiu (iniciou) o processo de divórcio no Brasil, uma vez que foi onde as partes se casaram.
A sentença de indeferimento
Contudo, o juiz, ao receber o processo, indeferiu (rejeitou o pedido), alegando que o divórcio não pode ser realizado no Brasil, uma vez que as partes residem no exterior (art. 485, I, CPC).
O recurso ao tribunal (2ª instância)
Inconformado, o advogado recorreu da decisão, pedindo ao tribunal a “reversão” (reforma) da sentença de indeferimento. O recurso foi fundamentado no artigo 21, do Código de Processo Civil Brasileiro. Vamos transcrever o referido artigo abaixo:
Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:
I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;
II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;
III – o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.(…)
Nas razões do recurso, o advogado alegou que o inciso III, do artigo supratranscrito (21, CPC), determina que “compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que” (…) o fundamento seja ato praticado no Brasil. Portanto, se o “ato” (casamento) foi realizado no Brasil, compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar o pedido de divórcio.
A decisão do tribunal
O tribunal analisou o caso e “reverteu” a decisão, concordando com a tese do advogado e, portanto, decretou o divórcio de Maria e João, conforme haviam pedido.
Jurisprudência do STJ
Para que nossos leitores fiquem mais seguros em relação ao nosso exemplo, vamos transcrever uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
“1. Embora atualmente os cônjuges residam no exterior, a autoridade judiciária brasileira possui competência para a decretação do divórcio se o casamento foi celebrado em território nacional. Inteligência do art. 88, III, do CPC. 2. Recurso especial provido”. (REsp 978.655/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 08/03/2010).
Comentário
Por fim, enfatizo que, infelizmente, as partes residentes no exterior podem passar pela transtorno e aborrecimento de recorrer de uma eventual decisão de indeferimento. Mas, como visto acima, a questão pode ser resolvida com um recurso à segunda instância, com base em jurisprudência do STJ.
Conclusão
O assunto divórcio de brasileiros residentes no exterior pode parecer algo simples, mas não é! Na verdade, algumas vezes é algo bastante complexo, caro e burocrático.
Vejamos algumas dúvidas comuns:
- O casal deve divorciar-se em Portugal ou no Brasil?
- Como fazer o divórcio no Brasil, se o casal não mais reside no Brasil?
- Será que é possível fazer o divórcio em Portugal, sendo ambos cidadãos brasileiros, com autorização de residência provisória?
- Se fizer o divórcio em Portugal, terão que fazer a “averbação” no Registro Civil do Brasil? Como fazer?
- Se fizer o divórcio no Brasil, o casal terá que fazer a transcrição (“averbação”) na Conservatória de Registro Civil de Portugal? Como fazer?
Essas são apenas algumas dúvidas, mas pode haver muitas outras.
Desde já, devemos lembrar que cada caso merece uma análise detalhada, pois a solução varia de acordo com o contexto.
O procedimento pode mudar em razão de:
- consensual ou litigioso (quando as partes não estão de acordo é litigioso);
- se as partes tem filho(s) menor(es);
- em que país o(s) filho(s) menor(es) residem ou vão residir;
- como será a pensão alimentícia e guarda e compartilhada;
- se as partes tem bens a partilhar;
- em que país os bens a partilhar estão (ex.: o imóvel está no Brasil ou em Portugal?).
Adriano Martins Pinheiro é advogado inscrito em Portugal e no Brasil
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